Ernesto de Souza Pachito
Neste texto vamos investigar alguns indícios que nos permitam localizar os meios estéticos, de propaganda e demagogia através dos quais uma parcela de certa sociedade subjuga as representações mentais das demais e, também pela coerção das armas, instaura um regime de governo totalitário.
Observemos a Alemanha nazista. Nesse caso, o grupo no poder privilegiou alguns estilos artísticos em particular. Na música, a valorização de Wagner é um exemplo capital. Wagner, o compositor da mitologia nórdica, do misticismo do Graal, das extensas óperas que tentavam funcionar como “obra de arte total”, ou seja, uma obra em que várias manifestações de arte estariam unidas num todo orgânico.
Não quero satanizar Wagner, ou, as modernas (ou antigas?) religiões que cultuam entidades da mitologia nórdica.
A condenação do jazz, de Igor Stravinsky, de Mahler, etc, foi uma escolha etnocêntrica por parte dos nazistas, o livro de David B. Dennis “Desumanidades: Interpretações nazistas da cultura ocidental” nos mostra isso.
O caso de Wagner nos apresenta curiosas coincidências, talvez, ou aspectos propositalmente escolhidos pelos ideólogos nazistas. Note-se que a opção pela linha curva e contínua da orquestração wagneriana ocorre em detrimento da linha interrompida – e que se desenvolve por saltos -, do sincopado jazz e de compositores modernistas, como no caso do próprio Stravinsky. Wagner, um romântico do século XIX.
Neste caso, parece atuar um arquétipo: a curva viking, ou celta, ou seja, da arte “bárbara” de tempos medievais, parece estar conciliada com a forma do desenvolvimento da totalidade das estruturas sonoras em Wagner.
A música de Wagner pode ser esquematizada como uma massa meio indiferenciada de sons que se move no tempo como uma nuvem no ar. Stravisnky falou isto, numa entrevista. Wagner, que seria budista, segundo Otto Maria Carpeaux, parece representar em suas obras o Brahman cósmico do hinduísmo/budismo: um todo que tudo penetra e que engloba tudo.
Mas a opção dos nazistas por Wagner nada tem de pacifismo budista.
Outro aspecto da política cultural nazista, revelado por estudos em História da Arte, é sua preferência por uma versão da estética neoclássica, mais geométrica no campo da arquitetura: o neoclassicismo nos remete ao classicismo grego do século V a.C., um estilo que apresenta equilíbrio, racionalidade e idealismo. Tal forma de expressão foi escolhida pelos nazistas como antítese ao modernismo, fragmentado em sua linguagem, como já disse em relação à música. No nazismo, o modernismo era visto como “degenerado”.
À arquitetura se junta a escultura grega antiga, como ponto de partida para o esquema escultórico nazista. Na Grécia do século V a.C. procurou-se representar valores de força e plenitude: a potência do jovem guerreiro ateniense, representado nu como figuração de virilidade e patriotismo, palavra com sentido deturpado no viés do totalitarismo.

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