Prof. Dr. Ernesto de Souza Pachito
Estamos, atualmente, cercados por teorias que atribuem às obras de arte rupestre, aos baixos relevos antigos, às obras de arquitetura e outras, a possibilidade de terem sido feitas por alienígenas em contato com alguma civilização terrestre antiga. As interpretações são literais e, pelo menos na arte bidimensional, fixam-se em realçar as características denotativas e a mimese da linguagem da obra de arte. Assim, formas que poderiam ser interpretadas como metáforas visuais, ou, manifestações do inconsciente coletivo, são vistas como a mímese de capacetes de astronautas, cabeças de seres de outros mundos ou peles escamosas dos supostos seres reptilianos. Nessas interpretações, o símbolo, no sentido que Goethe atribui a esta palavra, dá lugar a correspondências ponto a ponto entre a obra de arte e seus supostos modelos, como disse, criaturas extraterrestres.
Trata-se de neo-iluminismo, ou, neopositivismo, que usa a razão “linear” para chegar aos objetivos dessa interpretação, voltados a suposições e à possível, para os autores dos textos em questão, presença de alienígenas entre nós, em tempos passados, mas não só, pois também para o tempo presente são levantadas hipóteses de aparições e contatos entre extraterrestres e humanos.
O trabalho que ora se inicia é de caráter de análise da literatura alegadamente científica dessas abordagens, de caráter de análise plástico-visual, lógico e comportamental, além de político, na medida em que tais conteúdos são recebidos de alguma maneira por uma grande população de leitores e telespectadores, já que há séries não-ficcionais de TV de grande alcance internacional, neste tema.
Simplesmente, a citada maneira de abordagem dos fenômenos de arte já é uma maneira ideológica, como disse, ela nos remete ao Iluminismo e ao positivismo, evitando abordagens psicológicas, como as de Carl Gustav Jung, calcada nos conceitos de inconsciente coletivo e de sincronicidade. Também, não é utilizada qualquer abordagem dialética, salvo qualquer “dialética” (observem as aspas) contida nos conceitos da física quântica e relativista apresentados nas interpretações. Mas estes conceitos da física moderna recaem numa explicação mecanicista e numa leitura denotativa, como já disse, das obras de arte e dos fenômenos cósmicos supostamente ligados à origem destas obras. Também não são realizadas abordagens fenomenológicas, num tipo de aproximação que coloque em suspensão a diferença entre sujeito e objeto de estudo. Claro, o público alvo dessas obras não toleraria.
No futuro, abordarei livros de Erich von Daniken (o pai do gênero), Zecharia Sitchin e David Childress, além da série de TV por assinatura Ancient Aliens (Alienígenas do Passado, em português).
Esta última série parece focalizar, principalmente, monumentos megalíticos e as construções que possuem, em suas paredes ou muros, os megálitos, pedras gigantes, levantando, inclusive, as hipóteses de levitação, corte a laser e moldagem de blocos com argamassas especiais. Lógico, esta é a manifestação mais imediata dos fenômenos observados, sendo mais difícil de ser atribuída a humanos normais, dado o óbvio peso dos blocos e as distâncias dos monumentos em relação a pedreiras que estariam na origem de tais blocos.
Muito comum, também, pelo menos da série Alienígenas do Passado, é a comparação de figuras estilizadas com uma cabeça grande, e olhos circulares também grandes no interior dessas cabeças, com supostos alienígenas, mas na história da arte, tal cabeça de grande proporção em relação ao corpo, e mais os olhos exagerados, podem ocorrer devido a traços estilísticos expressionistas, ou ainda, traços simbólicos que podem se referir a emoções até mesmo ligadas a algum êxtase em rituais de iniciação. No entanto, todo simbolismo é rejeitado na abordagem de Alienígenas do Passado.
Como sou pragmatista de viés peirceano, não quero que tais teorias deixem de existir, quero apenas marcar a transição de uma interpretação simbólica e estilística (a da história da arte) para a interpretação denotativa que essas teorias implantam.
No dia de ontem, 14 de setembro de 2020, os telejornais anunciaram a descoberta de fosfina na atmosfera de Vênus, o que poderia evidenciar a presença de vida microbiana nesse planeta. O grande orçamento desse programa de televisão talvez possa indicar ajuda governamental a ele. Talvez o governo norte-americano esteja investindo alguma quantia para criar uma mentalidade, nos povos que assistem tal programa, no sentido de justificar programas espaciais caros que envolveriam sondas, viagens e estações espaciais. Pode-se dizer que a audiência desses programas, veiculados principalmente pelo canal por assinatura History Channel, e também pelo Discovery Channel, “respira” a vida extraterrestre e, de fato, trata-se, no meu ver, da (re)criação de uma mentalidade que não é nova, mas se encontra intensificada nos dias atuais.
Assim como o militarismo foi historicamente difundido pela máquina militar norte-americana, criando sentimentos patrióticos nos Estados Unidos e em seus países dependentes, as teorias ufológicas podem estar, inclusive, preparando o terreno ideológico para justificar investimentos na proteção da Terra, e dos Estados Unidos, contra supostamente possíveis ataques extraterrestres.
A presente temática tem inclusive uma importância militar. Veja-se o programa norte-americano de defesa anti-míssil da era Reagan apelidado de “Guerra nas Estrelas”.
Essas teorias, também, remetem-me a uma literatura de ficção científica em quadrinhos, ou, em pocket books, configurando uma estética pós-moderna, ou, uma ciência midiática pós-moderna.

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